18 de janeiro de 2011

exposição ESPACIALIDADES - curadoria Mario Gioia



Série Sobrevôo, 2010



Espacialidades

"Da distinção de um espaço, de uma forma urbana descende, gera-se a arte, que, por sua vez, permite distinguir, separar; intimamente relacionada, portanto, com a cidade, da qual nada mais é que a complexa epifania, a fenomenização. (...) Por outro lado, (...) os produtos artísticos são os que qualificam a cidade enquanto tal", ressalta Bruno Contardi em prefácio do essencial História da Arte como História da Cidade, de Giulio Carlo Argan.

Um novo espaço de artes encravado na nevrálgica avenida Rebouças, em São Paulo, e que tem o título de Galeria Central deve ambicionar estar intimamente ligado às questões da urbe, de maneiras mais claras ou mais sorrateiras. Por isso, Espacialidades tem como fio condutor a relação de artistas e o seu entorno. Em início de trajetória, os cinco nomes agora exibidos investigam de maneiras diversas os elos entre eles mesmos, o que produzem e o espaço ao redor, conflitos e fricções desse embate que não deixa de ser corpóreo.

Cecilia Walton busca os espaços de bastidores das atividades rotineiras, utilizando filtros impregnados de resíduos e que serviam como componentes de ar-condicionado, descobrindo desenhos construtivos neles. Pedro Cappeletti tem no processo sua linha mestra, intervindo, por meio de formas regulares em esparadrapos negros, e marcando superfícies que, pouco a pouco, ganham uma grafia também racional. "A linha é o rasgo, o limite da forma é o rasgo. Um ato violento. Não um corte preciso de tesoura, estilete ou bisturi, é um dilaceramento da matéria", comenta o artista.

Laura Gorski faz uma ocupação suave e gráfica, lidando com a memória de instantâneos tirados a bordo de aviões, muitos em momentos de lazer e férias. As paisagens planificadas olhadas sempre com a mediação de um vidro dialogam com traços de ordem construtiva, hoje transmutados na sobreposição de papeis coloridos, que repousam sobre uma comum mesa de trabalho.


Flora Rebollo e Fernanda Rappa criam narrativas de grande poética e muito próprias. Rebollo lança figuras deslocadas, que utilizam maquetes dentro de um universo estranhamente familiar, em que algo pode vir à tona e provocar ressonâncias temíveis. Um teatro da banalidade do cotidiano, um retrato da ação modificadora do homem sobre a paisagem, esta construída e nada nativa ou inofensiva.


Fernanda Rappa expande a linguagem da fotografia por meio de surpreendentes reuniões de fotogramas ou de imagens únicas. Algo misterioso e grave é antevisto, mas tudo isso vem mais da construção, a partir de elaborações por vezes aleatórias, criada pelo próprio observador. Seu olhar instiga, mexe e até brinca, se valendo de aproximações entre formas _uma piscina de pinguins sem os animais, um fragilizado bosque tomado pela neve_ e de sua atenta coleta de imagens menores, perdidas em não-lugares. Ao poetizar o insignificante, Rappa devolve-nos a complexidade e, em especial, a capacidade de ver, características propostas pelos melhores artistas.

Mario Gioia

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